sábado, 23 de agosto de 2008
Somente um ninguém importante.
Frente a porta havia um homem, não anunciado pelo porteiro, amigo de grande ultilidade. O homem estava parado, ainda descrente de sua nova situação. Recuperava o fôlego e decidia o que seria da sua vida no próximo segundo. O que seria de si mesmo, já que nunca fora consistente o bastante para decidir algo. Era tudo novo: inclusive ele. Havia um homem, nada mais que isso, exceto os lírios que ele mesmo colhera para a amada. Indagava-se sobre muitas coisas, uma delas se estava agindo certo.
Frente ao homem havia uma porta burra e irracional. O último obstáculo qu o separava de uma nova vida. Era ela, a porta, o que faltava. Depois de uma vida de horrores e negações, estava ele lá, esperando algum sinal. Era a porta, somente ela. O mais fácil de todos os desafios vividos ultimamente. O mais simples e o que mais lhe tomou a respiração. Ofegava, sem saber o que fazer.
Ouviu vozes.
Ali, em frente ao homem. Dentro do apartamente de luxo da senhora que o encantou, havia um outro ser. Era um outro homem, que já havia cruzado a porta. Era isso então, o medo, a decepção, o adeus. Antes sua vida estava esbanjando insolitez e nada tinha sentido. Agora, era tudo um nada.
Havia a porta, um homem e alguins lírios, que mucharam. Também havia um cartão escrito à próprio punho. Soltou os lírios murchos e foi, pra nunca mais voltar. Deixou sua nova vida pra trás. Ainda pensou em voltar, mas as vozes o ofendiam. Sentiu a pior raiva do mundo.
Chorou. Chorou novamente, desesperado. Uma lágrima quente caiu-lhe a face traida. Seu nariz avermelhou de tal modo, que nem mesmo um tomate seria mais vermelho. Não tinha mais os controle das pernas. Tombou, ali mesmo no elevador, enquanto gemia de dor. Era isso então: mais nada.
Foi-se. Para onde nem ele mesmo saberia dizer. Deixou a escolha pro destino, rumou em alta velocidade pra não se sabe onde. Um bar lhe sorriu e ele entendeu o sinal: enxer a cara, novamente.
Sentou-se e lá ficou. Bebeu tudo, até mesmo o que não devia. Estava drogado. Mulheres riam, comemoravam. Provavelmente eram mais uma daquelas desesperadas que ninguém atura. Mais risadas para um homem que não mais quer rir e mais bebida, pra um ninguém importante, que pagava por seu torpor.
Já não pensava. Vira e mexe se lembrava do seu nome, mas tudo fugia no segundo seguinte. o que seria daquele pobre homem, que não estava mais lúcido. As mulheres riam cada vez mais alto. Ele entendeu mais um sinal: era dele que estavam rindo. Algum escândalo começou, mas tudo foi impedido pelo dono do bar, já acostumado com os corriqueiros acidentes dos sábados.
Foi jogado pra fora. Expulso pela segunda vez. Entrou no carro e deitou. Quem era ele, afinal de contas, ninguém saberia dizer. Ligou o carro e esperou mais uma chamada do destino. Dirigiu embreagado e ligou para a amada. Disse algumas inverdades, ofendeu quem ama e desligou. Não obstante, ligou novamente e disse mais algumas coisas.
Ela comaçava a explicar que o homem que estava na sua casa era o seu irmão. Antes que podesse desculpar-se pelo erro um caminhão desviou sua rota, desviando o carro do bêbado. Capotou três vezes e morreu. Mas não fez diferença nenhuma, pois já estava morto mesmo. Somente alguém importante.
terça-feira, 19 de agosto de 2008
Parte três: Nádia e Roberto.
- É eu escutei a campainha.
- Tá esfriando.
- É eu sei, pega lá.
- Mas amor eu to vendo o jogo.
- E eu estou pondo a mesa. Roberto, você poderia, por gentileza, pegar a pizza pra mim?
- Querida, tá no final e eu...
- Agora!
- Mas o Davilson tá quase.
- Roberto, eu juro que se vc não levantar sua bunda do sofá eu acerto esse prato na sua cabeça.
- Amor, o prato doi.
- É, eu sei, vai ou não?
- Tá bom querida, onde está o dinheiro?
- Na sua carteira, óbvio!
- Eu que vou pagar?!
- É lógico.
- Mas eu paguei a conta do almoço de ontem!
- Roberrrrtô...
- Tá bom querida, deixa que eu pago, sempre eu que paga mesmo.
- Tá bom, eu pago seu mão-de-vaca. A Lisa que tem razão.
- Eu não sou mão-de-vaca e a Lisa não é paga pra ter razão.
- Fica aí vendo o Davison fazer o gol do milênio, eu pago a pizza.
- Querida, larga o prato que eu vou.
- Ah! O prato, toma aqui ó!
- Seu louca, esse prato foi presente...
- Ai meu deus! Eu te odeio sabia? Você é tão... Oi, tudo bem? Quanto é?
- R$17,25 mais gorjeta.
- Aqui meu filho, pode ficar com o troco.
- Amor, pra que tantos talheres?
- Talhares são ultilizados em refeições querido, você não sabia disso?
- Ah não... você não espera que eu coma pizza com talheres, né?
- Lógico que sim.
- Mas amor...
- Ah tá, você não espera que eu coma com as minhas mãos?
- Deixa pra lá, vou lavar as minhas mãos.
- Roberto, que feio. Que coisa de criança, olhe só você.
- É não amor, é lindo! Liberdade U-hu!
- Roberto!
- Nádia! Liberdade!
- Isso não tem graça.
- Claro que tem, pizza só tem graça quando comemos com a mão!
- Eu não vou comer.
- Come! O gosto é bem melhor. Eu garanto.
- Roberto!
- Nádia, querida!
- Você sempre come com a mão?
- Sempre comi sim.
- Então como sabe que é melhor?
- Porque... Porque...
- Te peguei! Coma de talheres, que eu como com as mãos.
- Tudo certo então, lave suas mãos.
- Roberto o que eu não faço por você hein?
- De que é a pizza querida?
- Peperonni, sua favorita.
- Noooossa, tem certeza que eu não posso comer com as mãos?
- É a condição amor.
- Odeio esses sachês de maionese.
- Porque?
- Porque? Nunca consigo abri-los.
- Me dê aqui, deixa eu tentar.
- Mas você não vai conseguir.
- Claro que vou, um simples sachê não pode parar Nádia!
- Dúvido você abrir!
- Quer apostar?
- Lógico! Só não pode usar a faca.
- Fechado! Quanto?
- Vintão.
- Fechado. vão ser os 20 reais mais fáceis de toda a minha vida.
- Quero só ver
- É só eu encaixar os dedos assim...
- Assim é?
- É que tá um pouco dificil...
- Dificil é?
- E eu não tenho forças nos dedos.
- Não consegue npe?
- Consigo sim, questão de honra.
- Honra?
- É sim.
- Você não consegue.
- Eu tô quase lá.
- Amor...
- Roberto, me deixa.
- Amor...
- Roberto!
- Nádia!
- O que é?
- Eu te amo.
-
-Vamos comer?
- Podemos comer sem talheres se você quiser.
- Podemos comer com talheres se você quiser.
- Deixa que eu mesmo abro a maionese.
- Odeio maionese.
- Desde quando?
- Desde agora. Nunca mais como maionese na minha vida.
- É só uma questão de técnica.
- Dúvido que você não consegue!
- Aposta mais vintão?
- Vintão!
- Consegui, sem a boca.
- Nossa, vou odiar sachês de tudo agora, pra sempre.
- Vamos ver na frente da Televisão?
- Roberto, o jogo de novo?
- Não amor, seu filme favorito vai começar agora.
- Rios de Lágrimas?
- Isso amor.
- Vamos.
domingo, 17 de agosto de 2008
O soldado da noite
Abriu a geladeira e durante alguns segundos fixou seus olhos azuis, os olhos mais lindos que o dinheiro pode comprar, na luz amarela de sua geladeira, último modelo. Deixou seu instinto guiá-lo. Gostava dos vários prato que haviam ali dentro, mas nada o fez morder os lábios de vontade. Ainda com os olhos fixos na luz amarela, pediu algum conselho; como quem tem um mentor espiritual. Achou, dentro de si, com a ajuda da luz, a resposta: bolo. Porque, raios, em um mundo de comidas deliciosas, em um mundo onde se tem tudo, menos o pobre bolo, queria ele comer algo diferente? Era típico dele querer o que não se tem no momento. Sastifazeria ele, comendo qualquer outra delícia, mas por fim, optou pelo bolo. Mesmo não havendo bolo na geladeira, decidiu perder algum tempo comprando mais um de seus desejos momentâneos.
Onde estavam as chaves? Procurou em todos os lugares, até mesmo nos menos improváveis. Sem as chaves, perderia mais tempo andando atrás de sua vontade incontrolável de comer bolo. E sem o bolo, a madrugada não faria sentido. Cansado de olhar várias vezes em todos os lugares, e de pedir aos santos que devolvessem as chaves do carro, decidiu ir para algum desses mercados novos que vendem de tudo.
Não contava ele que o mercado mais proximo, não era tão próximo. A distância e a preguiça o consumiam. Cansava, apenas de imaginar-se andando a noite, sozinho. Andou cansado e cansou de andar. Enquanto andava ao quartel-bolo, tentou lembrar qual seria a última vez que andou tanto. A vida o presentiou com todo o sucesso que quis quando era jovem. Nos seus melhores tempos caminhando para a faculdade. Caminhar, por mais longa que fosse a estrada, nunca o cansava. Esforçou-se para ter tudo o que tinha. Seu esforço foi válido, passou em um concurso público e hoje esbanja dinheiro e poder. Também pensava aonde as chaves poderiam ter se escondido.
Enfim, após algum esforço nas pernas, chegou ao supermercado. Sacou algum dinheiro confuso, fruto de uma trabalho desgastante e dirigiu-se a padaria do supermercado. Viu muitos bolos, dos mais variados tipos. Alguns com frutas, outros confeitados. Sentiu-se triste com tantas opções. Odiava opções, do fundo co coração. Sempre foi horrivel fazendo escolhas. A vida é feita de escolhas, e ele fez questão de escolher tudo errado. Não se sentia feliz, mesmo achando que a escolha mais racional o traria a felicidade. Não quis escolher, deixou o trabalho sujo para a atendende, que sorria para ele, de um modo forçado, denunciando ser aquela, a norma da empresa. Não importava qual seria a escolha da moça, seu dinheiro destastante, fruto de um trabalho confuso, poderia comprar qualquer bolo. O seu dinheiro poderia comprar todos.
Com o bolo em mãos, foi a fila do caixa. Lá havia uma outra moça, que não sorria. Era rápida, educada e nada mais que isso. Uma boa caixa, que não seguia as normas da empresa. A quebra-regras disse algum valor. Ao tirar a carteira do bolso, deixou cair algo alienígena no chão. Viu, mas não quis acreditar no que viu. Era típico dele querer olhar antes de acreditar. Mesmo olhando, não acreditou. Eram as chaves. Estiveram alí, no bolso do soldado, habitando em segredo. As coisas mais simples eram sempre esquecidas por ele. Perguntou-se quantas vezes esqueceu a chave do carro dentro do bolso e quantas vezes teve sempre que fazer uma árdua caminhada, na sua vida cheia de escolhas frustradas e erradas. A moça dizia novamente o valor da mercadoria. O soldado lhe deu alguma nova nota e recebeu de troco algumas moedas e notas sujas. As notas estavam sujas, mas um dia já foram novas. Talvez até passaram pelas suas mãos, em alguma outra ocasião. Quantas coisas admiramos pela beleza, que acaba?
Voltou pra casa, caminhando pelo mesmo caminho, mas não cansou. Acendeu a luz do apartamento bem localizado e comeu sozinho, um bolo gostoso. Prometeu a si que compraria mais vezes o bolo, se o acaso colocasse o soldado frente a frente com boa funcionária do sorriso forçado. Gostaria de conhecê-la, afinal, o dinheiro que comprar qualquer bolo, pode comprar uma escolha certa. A madrugada do sábado já estava começando. Apenas alguns minutos dividiam o sábado do domingo. Alguns minutos definiam os dias felizes dos dias ruins. Apenas alguns minutos eram necessário para um novo dia-escuro. As chaves, o carro, os minutos, a madrugada. Era hora de sair.
O bravo soldado saiu. Ligou para algumas pessoas, ainda na direção. Quebrava alguma regra de trânsito. Adorava quebrar as regras. Seguiu o conselho de alguma pessoa e foi para um lugar promissor, onde somente as pessoas mais quentes iam. Nunca fora quente; seria quente apenas por entrar nesse novo paraíso? E ao sair, se tornaria uma pessoa mais fria do que já era? não importava, a escolha de onde passaria a madrugada era mais uma escolha que não queria fazer. Chegou no paraíso promissor da semana.
Já era domingo quando entrou. Sentiu olhares e muito calor. As pessoas dançavam animadas e ele estava parado. O soldado foi ao bar e comprou a bebida mais cara do local. Bebeu sozinho por algum tempo, apenas por algum tempo, alguns minutos sentado e as possiveis companheiras da noite o cercavam. Nenhuma garota interessante por aqui. Nem por alí. Nem em lugar nenhum.
Saiu do bar e dançou, mesmo não querendo. Todo aquele barulho infernal o incomodava muito. Mexeu suas pernas em algum ritmo novo. Algumas pessoas riam perto do soldado, que ao escutar as risadinhas abafadas pela música, riu também. Agora ele ria. Ria muito, e dançava. Estava feliz, pensava. Quando mais novo desejou uma noite como essa: risadas e dança.
As risadas iam ficando mais forçadas e cansadas. Ninguém mais ria, por mais engraçado que tudo parecesse. Eram todas robôs japoneses, programados apenas para uma função, sem erros e sem sentimento. As pessoas riam, mesmo não querendo rir. Lembrou-se que talvez a boa funcionária do mercado pudesse ser um robô.
Foi aonde toda a gente dançava. Pareciam macacos, cheios de vida. Decidiu brincar de ser macaco. Macaquiou alguns minutos. Olhou desajeitado uma macaca que dançava perto dele. Sentiu que a conhecia, então lhe ofereceu a bebida mais cara do lugar. Ela falava, ele ouvia. Ela dançava, ele a olhava. Ela o olhou, ele a beijou.
Se beijaram o resto da noite, no apartamento do soldado, que convidou a moça para conhecê-lo. Foi isso então? Era uma manhã de domingo, e a bebida mais cara do lugar lhe dera dor de cabeça matinal.
Era dia, e havia uma desconhecida na nova cama confortável do soldado. Era dia, e agora? Porque se martirizava tanto, trazendo mais uma mulher que o dinheiro comprava para seu apartamento? Chorou. Fez café e serviu o bolo de não-sei-o-quê para a dama, que de imediato reconheceu o gosto delicioso do bolo. Apenas um lugar vendia o bolo. Apenas um supermercardo na cidade, apenas uma cidade no mundo. Tinha toda essa certeza, porque a receita do bolo era dela.
O homem riu, não acreditava. De imediato perguntou de que era o bolo. A moça disse que o bolo era um segredo. Apenas uma pessoa no mundo poderia saber de que era o bolo. Olhou a embalagem, e constatou: o bolo era de nada.
Um bolo de nada o fez feliz. Nada fez feliz a um soldado que tinha tudo.
Fim Idiota, mas tava grande e eu precisei cortar. Desculpas, depois eu ajeito.
quinta-feira, 14 de agosto de 2008
Minha mãe é um sapo
terça-feira, 12 de agosto de 2008
Xícaras
A minha favorita, qualquer um poderia dizer, era a preta. Tinha uma cor bem definida; um preto diamante-negro. Não era a mais alegre ou mais bonita; era exatamente igual as outras. Sua beleza estava ímplicita na ausência de cor. Foi amor a primeira vista; quando a vi, imediatamente a escolhi. Só tomei meu café com leite e baunilha com ella. Às vezes tomava água também, previnindo-me de agum possivel ciúme improvável de copos brasileiros. Ainda me pergunto o que ela estava fazendo ali, no meio de tantas cores alegres. De uma coisa tinha certeza: essa xícara fora feita por uma fada. Embora não distribuisse felicidade, tinha lá seu feitiço; roubava sorrateiramente todas as atenções para si. Talvez por ser tão menos alegre, tão menos bonita, tocava nossos corações, emersos em tanta solidão; e acabavamos nos sentindo um pouco menos solitários em nossa realidade privada, particularmente tão pública. A xícara emitia um sinal, captados apenas pelos corações mais parecidos com o seu tom diamante-negro. Sentia, sempre que a olhava, que todo o seu mal poderia fazer muito bem, e que até mesmo a tristeza mórbida de uma lágrima quente escorrendo por uma face sofrida, se tornaria um maravilhoso e raro espetáculo. Tudo se convertia. Hoje costumo sentir esse sentimento de felicidade indevida quando estou em crises. nenhum psicólogo poderia explicar; mesmo se pudesse, não acreditaria em nenhuma palavra.
Particpoude várias ocasiões importantes, bem como foi a única amiga dos que estiveram sozinhos e sem sono, dentro da madrugada fria. Abrigou os mais diversos gostos, e cores, e sentimentos impossiveis. Teve seu fim em uma segunda-feira melancólica, desapercebida de qualquer atenção. Mamãe quebrou e a jogou fora.
Haviam mais 5 xícaras.
Era a branca a mais irritante, se é que sou capaz de julgar o que parece ser irritante. nunca consegui sequer olhá-la por mais que alguns segundos sofridos. Era uma xícara perfeita, despertando assim, minha total falta de compaixão e atenção. Havia um perfeito contraste irritante, como jamais vi e verei: qualquer liquido, por mais morto que esteja, ganhava vida imediata e temporária dentro dela. Quando ninguém estava por perto, e quando já era bem tarde da noite, tinha a certeza de que ela, trancada no armário da cozinha, brilhava; não sei porque acho isso. Mas era certo que brilhava no escuro.
Às vezes olhava fixamente na sua direção, invejando os liquidos que ali ficavam e desejando por um momento sentir tanta vida. Se fosse uma xícara, jamais seria um xícara branca. Ainda não sei a cor exata, talvez laranja, talvez não-laranja; estaria disposto a ser qualquer outra cor, menos branco. Talvez até fosse branca, mas seria um de um tom particular de branco mesclado com manchas pretas, passando a impressão de uma paz frustrante, indevida de uma simples xícara, perdendo assim todo o meu brilho e minha paz. Se fosse uma xícara, possivelmente não seria a favorita, ainda que fosse exatamente igual a todas as minhas irmãs. Ficaria isolada, sendo convocada apenas quando não restasse mais nenhuma outra opção. Se fosse uma xícara, teria a companhia fiel de um pires. Às vezes pires não são lembrados. É somente convocado a apresentar-se a mesa quando quer mostrar-se classe. Os pires são mais nobres que xícaras, sempre foram. carregam consigo todo o fardo de uma xícara. São subordinados. Os pires nunca são lembrados pelo seu enorme esforço, apenas pela sua beleza momentânea. Atrevia-me então, a dizer uma mentira conveniente, na intenção de rebaixar-me um pouco mais: se fosse um pires, seria um simples e pobre pires opaco e sem graça.
A xícara branda, um dia apagou. Perdeu sua asa em uma queda e ficou sem valor.
A história mais ilariante, de certo, é a história da xícara verde. Era a xícara mais mal-interpretada. Poucas vezes lembrada por todos. Foi seu maior feito, um galo vistoso na cabeça do tio, que passava férias em casa; alvo certeiro da ira diabólica de mamãe em uma madrugada indevida. Em um sábado qualquer, já dormíamos, quando escutamos barulho de cachorros, que tirou do inefável mundo dos sonhos. Mamãe estava um pouco mais nervosa que o normal. Sem sono, sentou-se na mesa da cozinha e tomou um café, para despertar da agonia de não conseguir dormir. Sentiu uma mão em seu ombro, e sem pensar duas vezes, usou a xícara como objeto de defesa. A xícara despedaçou-se e esse tio nunca mais passou férias em nossa casa.
Ainda tem o mistério da xícara caramelo. Em uma noite a xícara foi guardada no ármario, no outro dia já não estava mais lá. Não havia evidencias de crime, mas eu sabia que havia sim um crime. um crime muito perfeito. Sou perito em resolver mistérios, desde sequestro de talheres até suicídio de copos; mas desaparecimento de xícara? Minha tese baseia-se em algo que n unca poderei provar, mas que tenho a certeza convicta de que aconteceu, e que foi de má fé. Não acho que foi desaparecimento, e sim homicídio doloso. E quem matou foi a xícara branca, que brilhava toda a noite. Talvez o seu brilho tenha matado e absorvido a caramelo. Talvez, ainda não posso provar. Mamãe disse que sumiu, e que de vez em quando as coisas somem, sem muita explicação. Sumiu, como tantos outros fantasmas do meu passado sombrio. Há um lugar aonde tudo que some, apareçe? Deve haver, deve haver.
Por fim, o pior: as xícaras esnobes. Vermelha e Azul. Mamãe viu alguma semelhança entre elas, e as ultilizou, enquanto vivas, para as prolongadas conversas no escritório que papai mantinha em casa. Papai nunca tinha tenpo pra família, apenas para os negócios, e mamãe sempre se ocupava, quando livre, servindo os chás-da-tarde no escritório de papai. Iam cheias, voltavam vazias, para novamente retornarem com algum café. Eram as xícaras, as únicas que ouviam as conversas confidencias que papai nunca nos deixou escutar. Quando as via indo para o escritório, cheias de algo delicioso, sentia um ar esnobe, como que fala: sei mais que você jamais poderá saber. E quando as via voltando, sentia que de algum modo, mesmo vazias, compartilhavam informações importantes. Comecei a sentir raiva. Em uma tarde, cansado de televisão e videogame, vi mamãe atravessando a sala, pela 5ª vez, com uma bandeja, usada apenas para as xícaras. Pedi para eu mesmo levé-las à papai. Carreguei meus desafetos, encarei-as com medo do que poderia fazer, e as soltei acidentalmente, quebrando em vários pedaços e causando mais trabalho pra mamãe.
Papai comprou um novo jogo de xícaras. Essas eram comuns, com alguns desenhos; todas iguais. As reuniões continuavam e mamãe desfilava elegantemente com outras xícaras, cuja história ainda não sei.
sábado, 9 de agosto de 2008
Parte II: Nádia e Roberto
- Roberto falou muito sobre você.
- Ai, o que é isso! Quando o Dr. chega?
- Ele está a caminho; conheça Luciano.
- Pode me chamar de Ferro.
- Olá Ferro! Está com fome?
- Faminto. Nádia, seu marido sabe que eu sou vegetariano?
- Ainda não tive tempo de...
- Olá querida, já conheceu Lisa?
- Oi amor, esse aqui é Luciano, pode chamá-lo de Ferro.
- Oi Ferro, desculpas pelo atraso galera.
- Que isso Dr. Roberto!
- Já podemos pedir? Ferro, aqui tem uma picanha sangrenta, uma delícia.
- Mas eu sou veg...
- Ô Grande! Ei engravatado!
- Pois não senhor?
- 4 chops, duas saladas para as moças e duas picanhas sangrentas aqui pra gente, né chapa?
- Na verdade eu...
- Ele tem uma academia, amor!
- A lisa é herndeira de uma rede de bancas.
- O Luciano dá aulas particulares.
- A Lisa fala Inglês, Francês e Espanhol.
- O Luciano é casado!
- A Lisa é solteira!
- Dr. Roberto, vocês estão juntos a quanto tempo?
- 3 ano em Agosto, querida.
- Ferro, você é formado?
- Claro, em fisioterapia, pela Unietê.
- Lisa é formada em adm pela Universidade concorrente.
- Nádia me disse que você tem um escritório...
- É sim, e Lisa está sendo meu braço direito ultimamente.
- Dr. Roberto, eu que aprendo com o Sr.
- As saladas e as picanhas chegaram.
- Demorou né? Ainda querem 10%.
- Mas eu não como...
- Dr. Roberto, eu odeio salada.
- Adoro salada, podemos trocar?
- Claro. Prefiro carne; não sou uma fã de clorofila.
- Salada é bem saldável.
- Odeio salada, é comida de bicho.
- Você já viu como é horrivel a morte de um boi? E a da vaca?
- Vi sim
- E continua comendo carne?
- Continuo sim. Você já viu a morte de uma chicória?
- Claro.
- E continua comendo chicória?
- Continuo sim, mas...
- Tudo a mesma coisa.
- Você é um assassino.
- Você é um animal!
- Carnivoro!
- Vegetariano!
- Idiota!
- Imbecil!
- Querido, não chame o Luciano de imbecil.
- Cala a boca Nádia!
- Não mande a Nádia calar a boca, seu assassino!
- Gente a comida á esfriando...
- Cala a boca Lisa!
- Não me mande calar a voca seu energumeno!
- Não chame meu marido de energumeno, sua energumena!
- Querida, eu sei me defender soz...
- Cale sua boca, seu energumeno! Porque você é tão...
- Começou! Agora vai querer discutir a relação; mulheres...
- Mulheres o quê? Homens são tão...
- Somos o que? Fala Lisa, se você é mulher...
- Sempre se acham superiores! Né Nádia?
- Né
- Nos achamos porque somos, né Ferro?
- Né.
- E somos sim.
- Prove!
- Vocês gastam duas vezes mais papel higiênico.
- Agora a culpa do aquecimento global é nossa?
- É sim querida.
- Dr. Roberto, me desculpa, mas eu já vou embora.
- Fica Lisa, estamos apenas debatendo assuntos conteporêneos.
- Não amor, você acabou de por a culpa do aquecimento global em nós.
- Mas é verdade Nádia.
- Luciano, cala a boca, você está demitido!
- O que eu fiz patroa?
- Nada; apenas cansei de comer salada. Comida de bicho. Garçom, mais uma picanha.
- Eu sabia que você não gostava daquela comida de bicho.
- Eu sempre gostei daquela comida de bicho.
- Não é comida de bicho.
- É sim, seu animal.
- Assassino!
- Vegetariano!
- Imbecil!
- Idiota!
- Chega rapazes! Ainda são superiores.
- Somos sim, temos os negócios da família. Mandamos em vocês!
- Dr. Roberto, me demito!
- Não se demite não; você está demitida!
- Mas eu me demiti primei...
- Então pague a conta.
- Mão-de-vaca.
- Incompetente...
- Ela era seu braço direito amor, não se esqueça disso.
- Amor eu...
- Recontrate-a.
- Mas amor...
- Agora!
- Mas eu não...
- E pague a conta.
- Mas foi ela que...
- Lhe espero no carro. Adeus Lisa, Adeus Luciano.
- Adeus Sr Roberto, segunda eu estarei lá. Adeus Dona Nádia.
- Adeus Lisa, Adeus Nádia, Adeus assassino...
- Amor, peça desculpas a Ferro.
- Mas ele me chamou...
- Ferro, peça desculpas a Roberto.
- Eu não quero...
- Vamos, dêem-se as mãos.
- Você pede primeiro.
- E ainda são superiores.
- Desculpa.
- Desculpado. Não vai pedir desculpas não?
- Não.
- Não desculpo então.
- Desculpas então.
- Então tá.
Continua...
sexta-feira, 8 de agosto de 2008
Oito do Oito do Oito
Também nunca lavava a louça ou varria a casa. Sempre dizia que tinha que por Matemática e Química em dia, sensibilizando assim a minha mãe. Ainda não sei como ainda funciona. Não que esteja reclamando, mas se ainda funciona é melhor aproveitar antes que acabe.
Era verdade; 18 anos e nunca vi abertura sequer de olimpíadas ou pan-americanos. Nunca vi; sempre algo atrapalhava; talvez as aulas...
Agora estava eu lá, sentando na sala, de frente pra televisão, encarando o Galvão Bueno. Faltando minutos para a abertura. Não sabia o que ia ver, mas esse Galvão prometeu-me um show de perfeição, porque "assim são os chineses". Desde quando os chineses são perfeitos? Até onde sei, eles nem tem liberdade de expressão. E eles são todos iguais... o perfeito é diferente de tudo que você já viu.
Vejo pessoas no estádio, que custou caro, com certeza. 90 mil ao todo, dizia uma mulher loira de olhos azuis. Vi pessoas de várias partes do mundo, algumas loiras alemãs, outras negras lindas e Africanas, que arrancaram-me suspiros. Outros Ingleses de olhos azuis, e até mesmo um grupo de Francezes cheios de si. Pessoas, como eu e você, com muito mais dinheiro, é claro.
Estava lá, e havia finalmente começado. Um show de tambores. Com chineses iguais. Tambores iguais. Expressões iguais. Estava tudo tão impecável; parecia até que se alguém espirrasse durante a dança, seria morto pelo exército. Tudo impecável. Apagou-se a luz, pensei: que feio, não pagaram a conta. Fiquei de boca aberta durante algum tempo. Não de suspresa, mas de sono. Estava chato. Lindo, mas chato.
Acordei quando vi uma menina tocando piano. Ela tinha 5 anos, a vadia. 5 anos gente! Eu não sabia fazer nada aos 5 anos, a não ser alguns desenhos pro meu pai. Será que aquela criança estava com medo? Ela riu, e eu ri também. Acordei pra vida.
Vi luzes e roupas laranjas. Adoro laranja, é a cor mais viva do mundo. Deixa tudo com graça. Laranja chama a atenção de todos. Agora que falei isso, vocês também começaram a notar mais laranja na vida. Espero que gostem da cor, tanto como eu gostei de ver um principe carregando uma bússola, vestido de laranja. Ele era o rei daquilo tudo e eu era seu servo.
Depois de duas horas vendo pessoas andar, achando que a tocha seria o marco da festa, decepciono-me. Um chines voando pelo estádio. Tão perfeitos, desse Galvão. Mentira, nunca mais vejo uma abertura de chineses. Eles são previsiveis.
Ah se eu tivesse ido a aula...
quinta-feira, 7 de agosto de 2008
Dedo no nariz.
Todos olharam mesmo. Em segundos eu me tornei um animal selvagem e perigoso, solto, na cidade-grande. Olhares me perseguiam: alguns repreendendo, outros surpresos, finjindo um falso nojo. Gostei de ver algumas poucas caras felizes com a situação, me dando o apoio. Essas caras, esses olhares, não me abalavam. Estava limpando meu nariz, ali, na frente de todo mundo, completamente certo de que era a coisa mais natural do mundo.
De todos as manerias, tentei classificar as pessoas. Executando a limpeza do nariz você consegue um novo método de classificar pessoas.
Há os que limpam o nariz e nunca assumem. O pior tipo, definitivamente. Enfiam o dedo com muito gosto e quando vêem alguém fazer o mesmo franzem suas testas e finjem nojo. Julgam, como se fossem um juiz da verdade, certos de que sua opinião é a mais correta. Eles fazem, não tocam no assunto e ainda mascaram as estatisticas. Quantas pessoas que você conhece limpam o nariz na rua?
Também há os que fazem, mas são discretos. Normalmente limpam o nariz quando não há alguém por perto. São culpados de serem humanos, é natural arrotar, cuspir e limpaz nariz. Mas eles sentem uma vergonha. Acho-os patéticos... quantas vezes os peguei com a mão na massa, se deleitando com a sensasão agradável de limpar o nariz. Nossa, divirto-me quando acabo denunciando a minha presença com um riso maléfico qualquer. É sempre a mesma coisa: abrem os olhos, limpam os dedos sujos na roupa e se desculpam.
Há os que fazem em qualquer lugar, sem medo de serem pegos e orgulhosos do ato. Normalmente somos felizes e, por isso, temos o total direito de, além de limpar o nariz, depositar a bolinha de meleca em uma parede qualquer da cidade; não só paredes, mas também assentos de ônibus, telefone público ou qualquer outra coisa pública.
Estive andando pela rua, feliz, limpando meu nariz, sem medo dos olhares. Depositei minha melequinha na parede branca, e quando estava perto de pegar o ônibus, vi uma melequinha. Comemorei.
Era alguém feliz.
Aceito suas desculpas esfarrapadas.
terça-feira, 5 de agosto de 2008
Parte 1: Nádia e Roberto
- Eu sei.
- Porque?
- Lisa.
- Lisa?
- Isso, Lisa.
- Quem é Lisa?
- Lisa, a estagiária, já lhe falei dela.
- Não; Não falou não.
- Sim, eu falei, me lembro de ter falado.
- Quando?
- Não sei. Sei que falei.
- Não falou.
- De quem?
- Lisa.
- Ah! Lisa, a estagiária?
- Sim, Lisa, a estagiária...
- Filha do Raimundo, da banca.
- Porque estamos comendo salada?
- Por que Luciano mandou.
- Luciano?
- Isso amor, Luciano.
- Que Luciano?
- Luciano, o marido de Lisa.
- Lisa, a estagiária? Ela é casada?
- Não, Lisa, minha amiga da academia.
- Não sei quem é.
- Sabe sim querido, agora coma a sua salada.
- Não gosto de saladas.
- Não gosto de estagiárias.
- O que você está querendo dizer?
- Nada demais...
- Você não está achando que...
- Ela é loira?
- Quem?
- Lisa, a estagiária.
- Não; É ruiva.
- Natural ou pintado?
- Natural, que diferença faz?
- Nenhum, apenas não gosto de loiras.
- Mas você é loira.
- Sim, porque você gosta de loiras.
- Gosto, mas prefiro morenas.
- Posso pintar meu cabelo.
- Querida, você está linda.
- Luciano disse a mesma coisa.
- Que Luciano?
- Luciano, o marido de Lisa.
- Lisa, a estagiária?
- Não, Lisa, minha amiga da academia.
- Você tem uma amiga chamada Lisa?
- Sim.
- E ela é ruiva?
- Não é loira.
- E Luciano?
- Luciano, o marido de Lisa?
- Isso, o marido de Lisa.
- É moreno.
- E quem é Luciano?
- Meu personal trainner.
- Desde quando você tem personal trainner?
- Desde o dia que você me chamou de gorda.
- Eu nunca disse que você estava gorda.
- Disse sim, e é por isso que estamos comendo saladas.
- Achei que Luciano...
- Ele mandou.
- Não gosto de saladas, e não gosto do seu personal trainner.
- Não gosto de loiras, e não gosto também de sua estagiária.
- Você está magra, não precisa comer salada.
- Você acha?
- Sim.
- Vamos acabar o almoço e ver um filme?
- Não, Luciano chega já.
- Você e esse Luciano não ...
- Não. E você e essa zinha não...
- Não. Eu te amo.
- Eu te amo também querido.
- Quero conhecer Luciano.
- Quero conheçer Lisa.
- Que tal amanhã?
- É.
- Almoço no Jhonny's?
- É.
- Vou chama-la hoje, no escritório.
- Vou chama-lo hoje, durante a aula.
- Tá.
- Querida, olhe embaixo do seu prato.
- Um anel?
- Isso, um anel.
- Que lindo! Foi caro?
- Foi.
- Querido, olhe dentro do seu guardanapo.
- Um relógio?
- Isso, um relógio.
- Foi caro?
- Foi.
- Te amo.
- Te amo também. Agora acabe sua salada.
- Não gosto de...
- Agora!
- Mas...
- Quando acabar tire a mesa.
- Quando voltar, lave os pratos.
- Okay, te vejo a noite?
- Sim.
- Até a noite.
- Até.
domingo, 3 de agosto de 2008
Chove dentro de mim
Está chovendo. Sim, está chovendo dentro de mim. Está chovendo, e é uma chuva grossa, com raios e trovões. Um chuva perigosa. Sempre está chovendo.
Lembro-me que um dia, no passado, fez um sol. Um sol brilhante, onipotente, rei de toda a luz do mundo. Então comçei a admirar o sol. Escrevia sobre o sol, falava sobre o sol, passava horas deitado, olhando o brilho, que era muito intenso, muito claro. Cansei-me de ficar deitado, olhando uma mancha preta no meu olho. Desvie meu olhar; mirei alguns graus ao oeste, e vi uma nuvem branca, que entra em perfeito contraste com o azul do céu. A mancha era cada vez mais incomoda e com o tempo, preferi não vê-lo mais. Começei então a sentir apenas a luz e o calor.
Houve um tempo em que eu estive completamente apaixonado pela nuvem, e desejei-a só pra mim. Lembro-me que ela chegou tão perto, que cobriu meu sol, aliviando meu sofrimento de ver tudo sempre tão claro. Sentia cada vez menos o calor e luz. Estive deitado, sentido dia após dia a proximidade da nuvem. Um dia a nuvem cobriu o sol por inteiro. Foi então que conheci o alívio de não ter nada te incomodando. Foi ótimo. Não tinha mais preocupações. Era uma pessoa feliz, mesmo sem o sol.
Os raios de sol ficavam cada vez menos intensos e já não havia tanta luz para a nuvem filtrar. O sol havia ido embora, ou teria sido a nuvem que matou o sol? Foi então que eu descobri o poder da Inveja, pelo caminho do amor. A nuvem nunca me amou, nunca me ajudou, nunca sequer soube que eu existia ali, embaixo de sua sombra. A nuvem, que parecia ser pura, apenas via o sol. Roubara meu antigo amor, e me deixara cego. Com o tempo, não havia mais luz, nem calor, nem mais nada.
Foi então que começei a enxergar a nuvem. O tempo que houvera passado embaixo de sua sombra reconfortante, foi necessário para recuperar a visão que perdi. Com algum esforço, resolvi abrir os olhos. Vi então uma nuvem safada e escura (existem nuvens safadas sim) cobrindo totalmente o sol. Nuvens derradeiras e possessivas, que nunca tiveram o seu brilho próprio, sempre ofuscadas pelo belo e brilhante Rei Sol. Sangue-sugas. Roubaram todo o brilho do sol. O sol, sem brilho, seria sol?
Passei a odiar as nuvens. Começei a maldizê-las. Tornei-me inimigo mortal das nuvens. Começei a pensar em um modo de devolver toda a vitalidade do meu sol. irritei-as. Fiz elas ficarem possessas. Assim então, começoua chover. Chove há tempos. Não consigo lembrar-me das nuvens, pois os pingos grossos caem como martelos em minha cabeça. Não consigo me lembrar da luz do sol. Começo a achar então, que devo adorar a chuva.
Houve um tempo em que adorava chuvas...