quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Omissão

Esse domingo chegou na tarde mais acolhedora possível. As antigas memórias tristes de um momento qualquer do passado simplesmente brotaram em mim, como por magia; vieram me torturar. Naquele passado fácil, que lembro julgar difícil em outras circunstâncias, eu costumava ser tão mais eu mesmo, que hoje, sendo torturado por essa presença incômoda, sinto estar em tamanha melancolia. Como tudo era mais fácil, como eu mesmo costumava ser mais fácil. Chego até a me surpreender e sentir saudade de todos os meus problemas.
Saudade essa que nem mesmo eu entendi ainda; meus antigos problemas, alguns insolúveis perante o tempo, até que eram convenientes para a dada época. Hoje eu sei que tudo não poderia ser mais fácil; é como o seu filme favorito: por mais vezes que você veja, sempre vai chorar nas mesmas cenas ou rir dos mesmos acontecimentos trágicos.
Pois agora, as cenas e as tragédias se repetem dessa vez com muito mais intensidade. Meu filme favorito ainda não teve final; poderia ter, mas eu fiz questão de viver as mesmas cenas, rir das mesmas coisas, chorar pelos mesmos motivos, odiar tudo do mesmo jeito... Estou me omitindo de mim mesmo. Talvez a única coisa que não omita jamais, será esse domingo acolhedor, que me deu um pouco de vida sem pedir nada em troca. Às vezes a minha omissão é benéfica; a maioria das vezes. Por tudo isso, me imitindo de tudo, ou de todos, encaro mais um problema, que ainda não sei o quão consistente poderá vir a ser. E o fato de omiti-lo já começa a apresentar os primeiros obstáculos. O simples fato de omissão, o replay do meu filme, me consumirá e me levará a outros possíveis problemas.
Entretanto, o modo simples de como me lembrei desse meu passado distante, me roubou um sorriso breve. Um sorriso que chegou rápido e quente e se foi, expulso de dentro de mim, por mim mesmo, apenas por não apresentar uma boa razão de existir.
As nuvens desse fim de tarde estão me convidando a sorrir; não somente as nuvens, como também as cigarras cantantes e a paz reinante de balanço da rede. Por ser viável, e por também ser de bom-tom, o sorriso distante do passado feliz e triste que tive, voltou.
Agora, tendo um bom motivo pra sorrir, e com problemas repetidos, estou sob a luz do sol quase se pondo, pensando em quem fui e em quem sou. Sob essa mesma luz, que em um passado passou despercebida, escuto de longe o sino do contentamento. Estou contente, pela primeira vez. Tudo aquilo que antes me incomodava, que era incerto e duvidoso, deixou de ter razão de vida. E todos os meus problemas desse presente sem futuro, deixaram de viver, apenas porque não tinham motivos suficientes para não me fazer escutar mais os sinos.
Um dia fui feliz. Feliz é muito mais que contente. Mas isso já faz algum tempo. As indagações pessoais, que hoje me são úteis, naquele tempo não existiam; mas não por não terem motivos, apenas não existia. Os sorrisos que eu dava eram quentes e sem motivos. Hoje eles não existem mais, moram apenas na minha memória de domingo. Naquele mundo enfraquecido só existia uma coisa: Uma oferta; a de não sorrir sem omissão