quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Fome do mundo.

Eu tinha toda essa ilusão que somente a comida me faria bem. Então, comia com tanta vontade, com tanta verdade, que eu tinha toda a fome do mundo. Dentre as minhas lanchonetes favoritas, tinha esta, que servia um tipo único de salgado; o mais delicioso que eu comi em toda a minha vida. Nos tempos negros, chegava com tanta vontade de comer, que não saberia distinguir isso da fome. Por isso eu tive, durante algum tempo, a pior fome do mundo.
Eu comia demais, e não me sastifazia com facilidade. Eu culpava o mundo da minha fome inexplicável, sem saber que eu era o culpado. Os efeitos da minha fome iam além da minha imaginação; a única coisa que me sastifazia era o salgado daquela lanchonete. Poderia falar de como ele é delicioso, mas eu sei que eu nunca vou conseguir explicar algo tão especial pra mim, e mesmo que tente, o sabor não ficará igual.
Foi nessa fome do mundo, e em um período de grandes crises, que eu fui à lanchonete, comer meu pecado feliz. E lá estava ele relusente, dentro da estufa, esperando apenas por mim, no seu direito de servir aos famintos, e eu faminto, no direito de integrá-lo a mim. O salgado co-existia dentro de mim, me fazendo uma pessoa mais feliz a cada dia. E eu me pergunto: o que dele ainda existe dentro de mim?
Todas aquelas vezes em que fui àquele lugar, tão faminto de tudo, esqueci de olhar pra mim, do lado de fora: estava mais gordo. Mas isso não era o problema real; eu continuava com toda fome. Eu já me desesperava, e quanto mais fome me dava, mais eu comia, e quanto mais eu queria comer, mais me dava fome. Foi então, que já triste comigo, fui a lanchonete, satisfazer minha fome infinita. Foi a última vez que eu fui àquele lugar.
Quando eu já estava sentado à mesa, quase com o salgado na boca, um mendigo deplorável parou no lado de fora e pediu um pedaço do meu salgado. Eu, com toda a fome do mundo, fiquei olhando ele por um tempo, ainda com a boca aberta, pronto pra comer tudo aquilo. O homem, somente ele, tinha tanta mais fome insesiável que eu. Eu, ambicioso e egoísta, olhei em seus olhos e disse: não.
Não sei como pude. Não sei como fiz. Sei que a partir daquele momento, eu não tive toda a fome do mundo nunca mais.

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