terça-feira, 26 de maio de 2009

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Dois prédios se confrontam diariamente em uma avenida. Alinhadas na vertical, uma contra a outra, 50 janelas são diariamente abertas pela manhã e fechadas no final da tarde, exceto em dia de chuva, quando não é sequer permitido pensar em abri-las. As pessoas encarregadas de abrir as janelas costumam chegar antes de todos, no primeiro ônibus da manhã. Ambos os prédios tem suas portas abertas as 08:00 na avenida principal e os empregados não costumam entrar pela porta da frente – essa é a ordem, vinda de alguém superior que não gostam de meras copeiras e faxineiras incansáveis e prestativas. Os empregados mais importantes se encontram na parte de trás dos prédios. Alguns observam o nascer do sol, outros apenas descansam as cabeças na parede de pedra. Prolongam ao máximo o início do expediente. Hora após hora, chegam pessoas diferentes, das mais diferentes tarefas, fazendo as coisas diferentes. Indiferente a tudo, a senhora ruiva nunca abre sua janela; é, na verdade a única pessoa diferente de todos. Então, o cotidiano do prédio os prédios é exatamente o mesmo, exceto pela senhora ruiva, que nunca abre a janela.
Há 49 janelas abertas e faz um belo calor sufocante. Enxergo do outro lado da avenida o meu próprio reflexo tentando trabalhar no mais novo projeto multimilionário encomendado para resolver o problema do trânsito caótico da cidade. Pela minha janela, tudo é cinza, e a única coisa que consigo sentir é o brilho do cabelo da senhora ruiva, ao longe. Nem o sol brilha tanto, nem mesmo consegue dar vida a demasiada morte característica da cidade. A janela fechada me impede de enxergar mais e me obriga a voltar minha cabeça às várias idéias que saiam organizadamente da minha cabeça.
Já não há mais idéias organizadas enquanto uma janela permanece fechada diante o brilho inspirador.

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