terça-feira, 23 de dezembro de 2008

A mesma noite repetida.

Continuar doía. Mas ele preferia assim, mesmo só, continuar sozinho. A dor não era forte, era apenas incômodo demais. Sozinho, ele vivia, procurando sentido em continuar vivendo. E assim continuava, andando pelas noites claras, observando o movimento da rua, do mundo. Ocasionalmente pensava, estacionando idéias não naturais, tudo muito inerente ao próprio tudo. Era uma noite clara, estrelas surgiam espontaneamente. Apenas uma caia, cortando o céu; a deixa para um pedido.
Mas que pedido?
Procurou dentro do mais profundo sentimento, da mais profunda falta, e nada achou. Viu a deixa para a sua vida vazia cair do céu, e não fez nada. Era o fim, mais um fim, mais uma chance jogada fora. Mas ele não ficou triste. Olhou pro lado, sentiu o vento frio e tomou uma decisão, mais uma decisão e por fim, mais outra decisão precisa. Mudou, mas não completamente. Andou pelas ruas, procurando algo sem saber que procurava. Achou um bar precário, daqueles que ninguém costuma ir. Sentou sozinho em uma mesa, bebeu muita cerveja gelada e escutou uma música que o fez bem. Foi fazendo tão bem que ele já chorava sem saber que fazia. E já tomava decisões não tão precisas, mas que fariam toda a diferença. Enfim, o bar fechava, e ele retomava sua infinita caminhada para algum lugar.
Uma caminhada sempre falha. Vvoltou para casa, sem respostas e sem lembranças passadas. O mesmo trabalho contínuo de encaixar a chave teimosa no buraco da fechadura, a mesma sensação de ter olhado duas vezes de dois modos diferentes para o cachorro, e enfim, a mesma sensação de ter andado à toa.
Deitou-se na cama. A janela aberta mostrava estrelas felizes, brilhando.

sábado, 13 de dezembro de 2008

Jucilene Maria

Ainda havia um resquicio de felicidade no seu rosto. Algo que durou por tempo incontável, e que naquele momento, com a passagem do carro de som, a fez lembrar que a vida não se resumia à pilha de louça suja a sua frente. Poderia ser extremamente linda, como a foto da cachoeira que o mês de novembro expunha tão alegremente para ela, ou poderia ser extremamente deprimente, tal qual agora estava.
Lavar louça a causava dor, ela refletia sobre qualquer coisa e tudo que era possível. Talvez fosse esse o momento em que ela estivesse completamente sozinha, pensando apenas no que ela havia se tornado, mas, principalmente, no que ela gostaria de se tornar; nada tão grandioso, apenas rainha do lar, dona da sua própria prataria, da sua própria vassouras, do seu próprio livro de receitas.
Lavando mais e mais, a cada dia, ela cogitava hipóteses. Algumas eram realmente válidas, outras nem tanto. Segredou tudo; era tudo absurdo, um dos grandes dessa vida, onde já se viu, alguém como ela, rainha do lar, certamente diriam. E manteve o segredo tão bem guardado, que ele acabou por integrar-se a ela como uma idéia maluca.
A mão áspera, sem direito a hidratante, sem direito a dor, apenas marcada pelos serviços domésticos. Poderia praticar piano; sempre a acalmou. A pia ainda não estava completamente limpa, tudo era válido, então. Ser senhora de si mesma não pareceu uma idéia ruim, se a patroa podia, porque ela não? Seu sorriso era lindo, ela era linda, mesmo disfarçada de emprega doméstica.
Chegou a última penela, algo não tão imundo, mas sem brilho. Ainda presa a seus pensamentos, demorou o máximo que pôde limpando, e quando já não havia nada mais para limpar, ela se viu refletida no fundo da panela. Ela se fazia brilhar de verdade, espetáculo magnifico. Viu-se como nenhum espelho poderia lhe mostrar, viu-se algo incrivelmente maior, não só de se limitar a panelas sujas. Lembrava sua mãe, tinha a cara truncada e forte.
E foi com a cara truncada e forte que ela voltou aos outros afazeres domésticos.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Enfim, um lixo eletrônico. Talvez eu apague.

Estava ouvindo aquelas palavras dificeis, segurando com a palma da mão o meu queixo, quase dormindo. Eu ouvia, mas ouvia apenas por ter que ouvir, prendido a algo que realmente não me interessava naquele momento. Foi quando eu olhei que na cadeira mais próxima da porta, ele tinha chegado, atrasado, como sempre. Não pude conter a explosão que isso causou dentro do meu peito; respirei aliviado. Eu levantei minhas sobrancelhas e ele retribuiu isso com um sorriso muito mais lindo do que eu poderia descrever. Foi muito mais que uma cena de filme romântico; daquelas que o ator está pedindo desculpas, e a sua senhora desmonta toda etsrutura de fim de namoro com um sorriso inesperado.
Eu esperava aquele sorriso, como quem espera um milagre em dias dificeis. Ele sorriu, e eu continuei olhando, pensando em infinitas coisas mais impossiveis, e montando situações hipotéticas, agindo hipoteticamente, em um futuro que só existia dentro de mim. De repente eu notei que já estava com o olhar naquele sorriso por muito mais tempo que deveria, então, retirei meu olhar, e o coloquei na professora, que nesse momento falva coisas cada vez mais incoeretes. E por mais que eu não quisesse olhar para ele, eu via o sorriso. Eu via um sorriso tão feliz em me ver, que quase não acreditava que poderia ser pra mim. Mas era meu, somente meu, e talvez ninguém tivesse um sorriso tão sincero. Por mais que eu não tivesse nenhum motivo pra sorrir, alguém sorria pra mim; e de repente eu fiquei feliz. Fiquei cada vez mais feliz, e se fosse possivel comparar meu estado de felicidade, eu o definiria em um sublime orgasmo gradativo: cada segundo que passava me trazia mais felicidade. E quando eu pensava que não poderia ficar mais feliz, o fato da felicidade me ter escolhido de uma maneira tão singela, me fazia sorrir mais.Eu realmente achei que poderia escrever sobre isso, mesmo que sendo muito pessoal. Eu já queria falar dele, inclusive, estou sendo absolutamente honesto com todos, de uma vez só. Ele era um segredo, assim como meu sorriso também era. Deixou de ser; agora é de vocês.